Diário de uma pandemia.
Estado de praga, os ratos.
Ratos vinham de todos os cantos. Ruelas, esquinas e bueiros semi abertos. Multiplicavam-se. Ao longe ouvia-se os gritinhos ardidos.
Num único dia, 19 mil haviam dominado a cidade.
Traziam consigo morte e terror por entre as patas cinzas peludas.
Em estado pânico, a praça ardia de febre e medo.
A regra era clara: #ficaemcasa #usamascara #laveasmaos #vivaosus. Mas não era para todos. Como explicar ?
O presidente explicou!
Falou da terrível morte da economia. Morreríamos todos falidos, empresários e políticos. Os pobres morreriam antes, de fome.
Parecia estar nu, usava apenas um tipo de brinco numa das orelhas. Devia ser para ouvir melhor seu povo.
O prefeito de joelhos, o bispo com as faces vermelhas, corria levantando a batina enquanto o pastor escancarava o evangelho anunciando o merecido castigo.
-Pecadores, pederastas, prostitutas, pobres, pretos, todos irão morrer!
Profetizava, o santo homem, em meio a saliva espumante que escorrida pelo canto da boca.
Castigo divino. Merecido! Merecido!
“ Estado de praga”. Era assim que chamavam.
Os Muros da cidade foram fechados. Iniciou-se a quarentena sem fim.
Famílias separadas. Casais estilhaçados no mesmo espaço.
Os mais doentes morreriam em casa abandonados.
Os velhos deveriam morrer em primeiro lugar, anunciou num discurso épico, o ministro da saúde.
O Sr. juiz decretou:
Prisioneiros devem enterrar cadáveres. Afinal, para que servem os prisioneiros?
Em um trabalho interminável, os corpos se multiplicavam e se acumulavam nas ruas.
Velhos, jovens, pretos, brancos, crianças, pobres e ricos.
Todos juntos e amontoados.
O que nos resta?
Aceitar o destino?
Não enterrar os mortos e morrer também?
Ou aprender a cozinhar e lavar o chão da casa?
Não tem registro.
Num determinado momento, as mortes começaram a diminuir.
Entre excitação, cabelos desgrenhados da histeria transbordante, as pessoas voltaram às ruas.
Fechou-se um ciclo. As portas da cidade se abriram. As famílias, então separadas, começavam a se reunir.
Terminou?
A praga durou 4 anos, mas poderia voltar a qualquer momento.
Helena Marques.
Texto Baseado:
A Peste- Camus. 1947.
Gostou de nosso conteúdo? Deixe seu comentário.